Conforme divulgado pela Prefeitura Municipal de Bragança Paulista, nesta terça-feira (12/07), o Relator Desembargador Osvaldo Magalhães, proferiu decisão suspendendo a liminar do Juízo da Segunda Vara Cível, que impedia a aplicação da Lei Complementar nº 938/2022, que dispõe sobre a Outorga Onerosa do Direito de Construir (OODC) e Outorga Onerosa de Alteração de Uso de Solo (OOAUS).
“O instituto da Outorga Onerosa é um instrumento de desenvolvimento urbano criado no Estatuto das Cidades, previsto no Plano Diretor aprovado em 2020 e legitimado pela Lei de Liberdade Econômica, cuja finalidade é permitir o crescimento urbano de maneira segura e consciente na utilização dos recursos naturais e expansão da infraestrutura urbana”, é o que consta nos veículos de comunicação social da Prefeitura Municipal.
Antes da votação, pela Câmara Municipal, fui chamado pelo Vereador Sebastião Garcia do Amaral a apresentar parecer sobre o tema.
Meu trabalho foi apresentado e apreciado, pelos Senhores Vereadores, por ocasião dos debates, recebendo elogios da maioria e críticas da divergência, notadamente do parlamentar Quique Brown.
A Lei Complementar foi aprovada, por maioria, pela Câmara, mas foi suspensa, por decisão do Meritíssimo Juiz, entretanto teve seus efeitos restabelecidos pelo Tribunal de Justiça, na última terça-feira.
Em meu parecer, deixei claro que o exame do tema “cinge-se tão-somente à matéria jurídica envolvida, razão pela qual não se incursiona em discussões de ordem técnica, nem se presta a juízo de mérito sobre o tema trazido à apreciação”.
Disse, também, que muitas capitais do Brasil e do mundo já introduziram, em seus ordenamentos jurídicos, a outorga onerosa, como instrumento hábil à obtenção de contrapartida.
“Trata-se de um ônus que incide sobre a área de construção que exceda o coeficiente determinado pela lei, deixando à escolha de quem constrói manter-se dentro do coeficiente ou ultrapassá-lo, neste caso se obrigando ao pagamento da parcela do “solo criado”” (Supremo Tribunal Federal, RE n. 387047-SC).
Esclareci, no parecer, que o Excelso Supremo Tribunal Federal (STF) já definiu que a cobrança da OODC – Outorga Onerosa do Direito de Construir – não é um tributo, mas uma obrigação urbanística com base constitucional na função social da propriedade. Vejamos a Ementa do Recurso Extraordinário n. 387047-SC, que tem como recorrido o Município de Florianópolis: “Não há, na hipótese, obrigação. Não se trata de tributo. Não se trata de imposto. Faculdade atribuível ao proprietário de imóvel, mercê da qual se lhe permite o exercício do direito de construir acima do coeficiente único de aproveitamento adotado em determinada área, desde que satisfaça prestação de dar que consubstancia ônus. Onde não há obrigação, não pode haver tributo dever e obrigação e entre ato devido e ato necessário. Distinção entre ônus, dever e obrigação e entre ato devido e ato necessário (…) Instrumento próprio à política de desenvolvimento urbano, cuja execução incumbe ao Poder Público municipal, nos termos do disposto no artigo 182 da Constituição do Brasil. Instrumento voltado à correção de distorções que o crescimento urbano desordenado acarreta à promoção do pleno desenvolvimento das funções da cidade e a dar concreção ao princípio da função social da propriedade (art. 170, III, o CB)” (decisão unânime, Relator Ministro Eros Grau, já aposentado).
Ao endossar o voto de Eros Grau, o então ministro Cezar Peluso (bragantino) disse entender a parcela do “solo criado” como uma forma de ressarcimento da sociedade, por intermédio do Poder Público, pelos investimentos adicionais em infra-estrutura que tem que fazer.
A decisão em comento é de 06 de março de 2008. Passado mais de 14 anos, incrivelmente, ainda existe resistência, mas é incontrovertível que muitas cidades que introduziram a OODC avançaram enquanto que as outras foram ficando para trás.
Não se trata de um imposto, nem tributo, tampouco obrigação. Depreende-se da Ementa e da fundamentação do Acórdão do C. STF que se trata de um ônus que incide sobre a área de construção que exceda o coeficiente determinado pela lei, deixando à escolha de quem constrói manter-se dentro do coeficiente ou ultrapassá-lo, neste caso se obrigando ao pagamento da parcela do “solo criado”.
Em contrapartida da aquisição do direito de construir nessas áreas, os recursos financeiros obtidos são devolvidos à cidade e reinvestidos na implantação de melhorias, como programas habitacionais de interesse social, ordenamento da expansão urbana, implantação de equipamentos comunitários, criação de espaços públicos, proteção de áreas de interesse ambiental e cultural, projetos previstos nas leis de Operação Urbana, dentre outras definidas pelo Estatuto das Cidades.
Além disso, o Município poderá utilizar a ferramenta da outorga onerosa para otimizar práticas de ocupação e requalificação dos espaços urbanos, bem assim servir como ferramenta hábil a incentivar o adensamento nas regiões centrais e em torno das principais vias da cidade, e desincentivar ampliação do perímetro e a realização de novos parcelamentos de solo, substituindo a ocupação espalhada por uma cidade compacta.
Por outro lado, para os empreendedores, o outorga onerosa oferece a oportunidade de construir mais em áreas centrais e com infraestrutura melhor desenvolvida, obtendo preços mais atrativos para investir em regiões onde a prefeitura deseja incentivar a ocupação, a fim de estruturar e direcionar o crescimento da cidade de forma mais eficiente e sustentável.
A facultatividade da adesão ao sistema, pelo empreendedor, evidentemente, permitirá a análise da relação custo-benefício, norteadora de toda a atividade construtiva comercial.
Meu parecer é longo e está fundamentado em obras de vários juristas de renome, de modo que não caberia nesta coluna.
Conclui meu trabalho dizendo que “a adesão à outorga onerosa é facultativa, não é um ônus e tem por objetivo equilibrar e racionalizar o exercício do direito de propriedade, mediante uma contrapartida em favor do município, de modo a permitir seu crescimento mais ordenado, racional e sustentável”.
O debate é salutar e democrático!
Como cidadão e advogado, agradeço a confiança depositada pelo Vereador Sebastião Garcia do Amaral e espero ter contribuído, para o desenvolvimento mais sustentável, racional e humanístico, de nossa cidade.
OSVALDO ZAGO é Advogado, Procurador-Geral do Grande Oriente do Brasil, Relator do Tribunal de Ética e Disciplina da Ordem da Ordem dos Advogados do Brasil e Diretor Jurídico da Associação dos Ex-Combatentes da Região Bragantina – FEB.