Uma criança ao amanhecer, um homem de barba ruiva ao meio-dia, um ancião de barba branca ao cair da noite. Três formas. Assumidas por uma única entidade folclórica. A lenda do misterioso Barba-Ruiva é uma das mais populares do Piauí, e está ligada à gênese da grande Lagoa de Parnaguá, com suas águas repletas de causos e misticismo.
Tudo começou com uma família de três irmãs, filhas de uma velha viúva. Uma delas, ainda jovem, quando se viu com sintomas de gravidez, resolveu isolar-se na mata, para dar à luz ao filho. Envergonhada por ser mãe solteira, e com medo da recepção de sua família, colocou o bebê dentro de um tacho de cobre, e o atirou em um riacho que por ali cortava entre as carnaúbas.
Curiosamente, a partir daquele acontecimento, o singelo riacho começou a crescer de modo repentino. Cresceu tanto que engoliu o bosque e todo o povoado, originando a Lagoa de Parnaguá. Muitos acreditam que tenha sido um castigo da astuciosa sereia Iara, que adotou o pobre bebê rejeitado e o criou nas águas encantadas. Também passaram-se a ouvir vários sons estranhos daquela lagoa, como ecoantes choros, gritos e relinchos, além de vozes e luzes indecifráveis, e até mesmo vendavais e ruídos de pratos entrechocados. Foi quando começaram a circular histórias sobre o tal do Barba-Ruiva, um estranho homem que emergia das profundezas.
A forma mais comum pela qual é narrado, explicando o nome que recebeu do povo ribeirinho, é a de um homem bem branco e de aspecto intrigante, bastante alto e robusto, com cabelo e barba avermelhados, além de unhas e peito cobertos de lodo. Também existem relatos de sua forma mirim pelas manhãs, e principalmente da versão macróbia de barbas esbranquiçadas que surge à noite. Como se aquela figura mágica vivenciasse todo o ciclo da vida em apenas um dia, mas pela eternidade.
Normalmente avistado tirando um cochilo e tomando sol sobre as pedras, todo sossegado, pode transmitir uma aura inofensiva. Dizem que costuma fugir quando vê algum homem; dirigindo-se lentamente até a lagoa, e desaparecendo nas águas. Já em relação às mulheres, nutre o desagradável hábito de tentar abraçar e beijar aquelas que vão até o local. Não há mulher que se aproxime do enfadonho Barba-Ruiva.
Caio Sales é ilustrador e escritor, autor da série O Imaginário do Mundo. Pós-Graduado em Marketing pela PUC-Campinas, também é criador do blog My Creature Now, sobre criaturas mitológicas e lendas urbanas. @caiosales_art | Acesse: www.mycreaturenow.com