Gritos horripilantes acompanham esta criatura. Que passeia pelos matagais berrando, com urros que parecem muito distantes em alguns momentos, e muito próximos em outros. Os gritos penetrantes desse homem bestial enlouquecem e amedrontam as pessoas. Sons tão familiares, que em alguns momentos os berros parecem vir de amigos ou parentes, fazendo com que os caçadores e viajantes saiam em busca da origem dos urros e acabem perdidos. Atordoados, encontram um único vestígio, pegadas profundas na terra, em formato circular, como um fundo de garrafa.
Essa é a situação descrita por aqueles que encontram o misterioso Pé de Garrafa. Lenda bastante difundida no Piauí, ela também é contada no Mato Grosso, como uma variação do Mapinguari e Capelobo. O Pé de Garrafa também pode ser mencionado em Minas Gerais, embora exista uma certa imprecisão de informações nesse estado, associando-o com a lenda do Bicho-Homem, podendo se tratar de uma variante, uma mescla ou exatamente da mesma criatura.
Suas descrições variam bastante de acordo com cada região. Uma criatura humanoide e coberta de pelos, exceto na região do seu umbigo branco. Ora é bicho, ora é homem. Possui um chifre e um único olho no meio da testa, podendo ser retratado com um ou dois braços, acompanhados de poderosas garras. Sua principal característica é aquela que o batiza, o pé redondo em forma de garrafa. Alguns relatos dizem que tem duas pernas, mas na maioria das vezes é citado com uma única perna no meio do corpo, assinalando suas pegadas ao saltitar pelas matas.
Há quem faça ligações entre o Pé de Garrafa e o Diabo, por conta do seu chifre, garras e membro inferior deformado. Devido a isso, alguns dizem se tratar de um ser demoníaco, porém, suas outras características denotam origem indígena, não cristã. Os mais temerosos acreditam que o monstro devore ou aprisione a alma de sua vítima em seu pé.
É muito raro alguém vê-lo, mas caso alguém presencie a criatura, recomenda-se que tampe os ouvidos e atravesse um ponto de água corrente, pois o pesado monstro ficará preso na lama do fundo do rio. O Pé de Garrafa também pode ser abatido caso alguém acerte um tiro no seu umbigo. Não há provas de que tenha feito algum mal físico, mas não é descartado que alguns ataques cruéis – como os do insaciável Bicho-Homem, em Minas Gerais – sejam diretamente atribuídos ao Pé de Garrafa. Perturbador de caminhos no Mato Grosso, inofensivo no Piauí. Aparentemente ele apenas se diverte apavorando e confundindo as pessoas.
Caio Sales é ilustrador e escritor, autor da série O Imaginário do Mundo. Pós-Graduado em Marketing pela PUC-Campinas; e Pós-Graduando em Sociologia, História e Filosofia pela PUC-RS. Também é criador do blog My Creature Now, sobre criaturas mitológicas e lendas urbanas. @caiosales_art