Um ovo de cobra ou sapo chocado por uma galinha, ou um ovo de galinha chocado por uma cobra ou um sapo. Assim nasce o Rei das Serpentes, o mortífero Basilisco. Capaz de liquidar suas vítimas com intensas chamas ou potentes toxinas; aquele que encará-lo será instantaneamente petrificado.
A criatura recebe essa alcunha de realeza pois afugenta as sensatas serpentes que não desejam ser aniquiladas por ele, deixando até mesmo presas já mortas para seu rei – sua autoridade também afeta outros répteis. É justamente sua crista que lhe concede o prestigio de ofídio soberano, como se fosse a coroa do monstro. Inclusive, foi batizado como basilískos pelos gregos, carregando a definição de “Pequeno Rei” em seu significado.
Pequeno Rei, pois na Roma Antiga a criatura se fez presente pela primeira vez na literatura através da enciclopédia Naturalis Historia, do naturalista Plínio, o Velho. A obra descreve o Basilisco como uma serpente de trinta centímetros ou menos. O naturalista romano também conta que o efeito tóxico do réptil era tão fulminante, que ao ser golpeado pela lança de um cavaleiro ingênuo e infeliz, teria seu sangue venenoso escorrendo pela arma até chegar às mãos do malfadado paladino, de forma fatal. Até mesmo no período renascentista o réptil foi citado. Leonardo da Vinci definiu o temperamento sádico do monstro narrando sua atitude tirana de definhar a flora para matar a fauna, quando impossibilitado de fazer uma vítima direta com seu olhar petrificante
A criatura compõe o bestiário europeu figurando em inúmeras regiões e eras. Adquirindo diversas crenças, simbologias e descrições ao longo de sua jornada pelo imaginário popular. Acreditava-se que os vistosos Grifos eram seus inimigos mortais, e que os vigorosos Dragões eram seus aliados. Na Alemanha e na França é tratado como um ser de extrema raridade, que só pode ser tocado pelas mulheres. Em contrapartida no cristianismo medieval e na arte cristã é reputado como anticristo, símbolo de traição, doenças e luxúria. Enquanto na alquimia é símbolo da força e do poder do fogo, representando a Pedra Filosofal. Em outras culturas também é símbolo de sabedoria.
No contexto de suas características físicas, com o tempo tornou-se uma criatura detentora de asas e garras de galo, além do corpo de réptil. Tornando-se correlato ao Cocatrice das lendas europeias, podendo tratar-se de uma variação do mesmo, ou de seres com um certo grau de parentesco ou categoria mitológica. O Basilisco também recebeu na Idade Média a aparência de uma gigantesca víbora com cabeça de galo. Aparentemente indestrutível, a única forma de derrotá-lo seria refletindo o olhar da monstruosidade num espelho, embora também seja possível detê-lo com uma doninha, pois o forte odor do animal seria uma das curiosas fraquezas do inclemente Rei das Serpentes.
Caio Sales é ilustrador e escritor, autor da série O Imaginário do Mundo. Pós-Graduado em Marketing pela PUC-Campinas, também é criador do blog My CreatureNow, sobre criaturas mitológicas e lendas urbanas. @caiosales_art | Acesse: www.mycreaturenow.com