Quando eu estudava inglês na Alumni, havia uma lição chamada “The Unicorn in the Garden”, um conto do realismo fantástico propício ao treino de fluência no idioma de Shakespeare. Mais recentemente, uma das netas fez voltar à cena esse animalzinho simpático e quis sua festa de aniversário baseada nele. Mas o unicórnio se tornou hoje algo mais pretensioso e mais consistente. É o nome que batiza as startups que têm valor superior a um um bilhão de dólares, ou cerca de quase quatro bilhões de reais.
A campeã no estímulo à criação e desenvolvimento de tais empresas é a China. Houve tempo em que se fazia ironia com o “made in China”. Hoje o “designed by China” prevalece como indicação de produto de qualidade, compatível com os melhores dentre os países mais adiantados.
A China progrediu porque investiu em educação. Não há greve, não há vandalismo na escola. Pai que não manda filho à escola vai para a prisão e ali paga sua estadia. O Estado toma conta da criança cujos pais são ausentes.
Com isso, chegou a desenvolver superaplicativos fornecedores de um sem número de serviços. Seu ecommerce faz entrega dentro em trinta minutos no máximo. Ela já está quase inteiramente mergulhada na economia digital, nada obstante sua imensa população.
A cidade de Hangzhou, capital da província costeira de Zheijiang, foi berço natal de Jack Ma, fundador do Alibaba, a sexta maior empresa do mundo. O município tem oito milhões de habitantes e conta com trinta incubadoras e dezesseis unicórnios. O total de unicórnios na China supera 160. O Brasil, com 208 milhões de habitantes, tem quatro. Em 2015 foi inaugurada a Dream Town (Cidade do Sonho), espaço apropriado a empreendedores locais e estrangeiros de tecnologia. São quase quinze mil pessoas trabalhando em 1.645 startups. O governo oferece o espaço físico, acesso à nuvem de dados por três anos, auxílio-moradia e treinamento e formou fundo de investimento anjo de 500 milhões de yuans, algo como quase 280 milhões de reais.
A Cidade dos Sonhos está ao lado de duas universidades, vários institutos de pesquisa e ali sobra dinheiro. Seu objetivo é recrutar talentos do mundo inteiro. Doze horas de trabalho por dia, seis dias por semana. Ocorre que o jovem chinês sabe onde quer chegar. Quer dominar o mundo. E não vai demorar para que isso aconteça.
Imagine que a China forma quase cinco milhões de engenheiros e cientistas por ano. Aqui no Brasil, o número mais aproximado a isso é de advogados. Dos quais, ao que parece, a Nação já não precisa de tantos mais.
A competição com os Estados Unidos quanto ao domínio da Inteligência Artificial está sendo vencida pela China. Ali não funcionam os apps sociais do Ocidente. Não entra Facebook, Instagram e WhatsApp. Mas eles têm o WeChat, com 1,1 bilhão de usuários. Presta os mesmos serviços que aqui nós chamamos de Uber, Amazon, WatsApp, Tinder e Facebook. Com a vantagem é de que ele substitui o cartão de crédito.
Todos os jovens chineses já pagam suas contas pelo smartphone. Com isso, o banco central pode reduzir a emissão de dinheiro, o que poupou o Erário. Em 2017, foram transacionados pelo celular cerca de sete trilhões de dólares. Mas isso não é tudo. Em muitas lojas, a leitura facial reconhece a pessoa e a relaciona com sua conta já cadastrada num aplicativo.
Enquanto isso, nós continuamos a insistir na escola tradicional que afugenta o jovem e o empurra para a droga, para a criminalidade ou para a ociosidade. É preciso inverter essa equação cruel e deixar a criança e o moço fazerem aquilo que sabem e de que gostam: brincar com a realidade virtual e exercer criatividade. Decorar informações que podem ser localizadas no Google em segundos é algo totalmente superado. Agora é a vez de fomentar a febre por unicórnios. É disso que o Brasil precisa.